Condenação de Lula na 2ª instância no caso do sítio: veja as provas que basearam a decisão do TRF-4

Por G1

Lula é condenado em 2ª instância no caso de Atibaia e pena é aumentada

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) confirmou, nesta quarta-feira (27), a condenação em 2ª instância do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no processo sobre o sítio de Atibaia. A decisão foi unânime, e os três desembargadores votaram pelo aumento da pena de Lula para 17 anos, um mês e dez dias.

Em fevereiro de 2019, Lula havia sido condenado a 12 anos e 11 meses por corrupção e lavagem de dinheiro no processo da Lava Jato que apura se ele recebeu propina por meio da reforma de um sítio em Atibaia (SP).

Veja, abaixo, as provas e os argumentos citados nos votos de cada um dos três desembargadores que julgaram o recurso de Lula:

João Pedro Gebran Neto (relator)

Gebran Neto fala sobre condenação de Lula

RESUMO das provas e argumentos citados no voto do relator Gebran Neto:

  • Interrogatório de Marcelo Odebrecht, ex-presidente da Odebrecht e réu no processo;
  • Interrogatório de Emílio Odebrecht, ex-presidente do Conselho de Administração do Grupo Odebrecht e réu no processo;
  • Documentos encontrados no apartamento de Lula em São Bernardo do Campo durante cumprimento de mandado de busca e apreensão;
  • Georreferenciamento dos telefones de Leo Pinheiro, ex-presidente da OAS, e Paulo Gordilho, arquiteto da OAS, ambos réus no processo;
  • E-mail de Marcelo Odebrecht a Branislav Kontic, assessor de Palocci;
  • E-mail de Marcelo Odebrecht à secretária de Emílio Odebrecht;

DETALHES das provas e argumentos citados no voto de Gebran Neto:

1. Interrogatório de Marcelo Odebrecht

O depoimento de Marcelo Odebrecht, filho de Emílio, também foi usado pelo desembargador para embasar sua decisão. Entre as informações prestadas por Marcelo em depoimento à juíza Gabriela Hardt, de 1ª instância, estão o fato de que, quando ele assumiu a presidência da empresa, foi informado, durante a transição do antigo presidente, Pedro Novis, de que já havia um entendimento por parte de seu pai e Lula de que Antônio Palocci, ex-ministro da Fazenda e ex-tesoureiro do Partido dos Trabalhadores, seria o indicado por Lula como seu intermediador em tratativas a respeito de propina e apoios da empresa a campanhas eleitorais do PT.

Marcelo também confirmou que as transferências a Palocci eram registradas na “planilha especial italiana”, apreendida durante as investigações no computador da secretária dele.

“Tudo isso está nos autos”, afirmou Gebran. “Não são só palavras de Marcelo Odebrecht, mas em documentos, e-mails que vêm a corroborar. Essas palavras também são corroboradas por Pedro Novis, que antecedeu o Marcelo na administração da Odebrecht.”

Gebran Neto fala sobre condenação de Lula e Marcelo Odebrecht

2. Interrogatório de Emílio Odebrecht

O relator do processo afirmou que, em seu depoimento, Emílio Odebrecht confirmou as suspeitas de que o “amigo do meu pai”, citado reiteradas vezes por Marcelo Odebrecht, era de fato o ex-presidente Lula. Também confirmou que se reuniu com Lula em 30 de dezembro de 2010, nos últimos dias do mandato do petista, e lhe disse que a entrega da reforma do sítio em Atibaia estava prevista para meados de janeiro do ano seguinte.

Isso, segundo Gebran, é um dos indícios que comprova que Lula tinha ciência dos trabalhos de reforma do sítio e das circunstâncias em que ela ocorrera.

3. Documentos apreendidos no apartamento de Lula

O relator elencou uma série de documentos encontrados durante o cumprimento de um mandado de busca e apreensão no apartamento de Lula em São Bernardo do Campo (SP). Entre eles, diz Gebran, estão notas fiscais emitidas em nome de Rogério Aurélio Pimentel, assessor de Lula, referentes à compra de objetos que, de acordo com a acusação, foram adquiridos para uso no sítio em Atibaia.

Entre os exemplos citados por Gebran estão uma capa de piscina e despesas de vidraçaria em nome do primeiro engenheiro que atuou na reforma do sítio.

4. Georreferenciamento dos telefones de Leo Pinheiro e Paulo Gordilho

Outra evidência destacada pelo relator foi uma série de dados extraídos dos telefones celulares de Leo Pinheiro, ex-presidente da OAS, e Paulo Gordilho, arquiteto da OAS. Gebran diz que os dados comprovam a localização de ambos nas proximidades do apartamento de Lula em São Bernardo do Campo na data e horário em que Leo Pinheiro afirmou ter se reunido com Lula e Marisa Letícia, no apartamento deles, para apresentar-lhes os projetos de reforma do tríplex no Guarujá e da cozinha do sítio em Atibaia.

O relator explicou, durante seu voto, que o sítio passou por três reformas desde que foi comprado por Jonas Leite Suassuna Filho e Fernando Bittar. Gebran explicou que existem dois sítios, o Santa Bárbara e o Santa Denise, mas que, na prática, trata-se de uma única unidade territorial, que tinha um único proprietário.

Tal proprietário concretizou a venda de ambas as unidades aos dois compradores na mesma data: 29 de outubro de 2010. Desde então, o local foi alvo de três reformas investigadas no processo. A primeira começou em novembro, sob o comando do pecuarista João Carlos Bumlai, também réu no processo.

No mês seguinte, o desembargador diz que a Odebrecht, com autorização de Emílio Odebrecht, assumiu a reforma do local, com a intenção de concluí-la em janeiro de 2011, pouco depois de Lula deixar o cargo de presidente da República.

Finalmente, uma terceira reforma, principalmente na cozinha do sítio, foi feita pela OAS, sob a orientação de Leo Pinheiro.

“Pouco importa a questão da propriedade do sítio. Se a propriedade é formal do presidente Lula e material do Fernando Bittar. O que importa é que a propriedade do sítio – embora haja, ao meu juízo, fortes indicativos de que a propriedade possa não ser de Fernando Bittar –, o que parece relevante não é a escritura, o fato de Bittar ser laranja. O que importa é que o presidente usava do imóvel”, afirmou Gebran.

5. E-mail de Marcelo Odebrecht a assessor de Palocci

Outra prova citada no voto do relator foi um e-mail datado de 23 de agosto de 2010 apresentado por, Marcelo Odebrecht. A mensagem foi enviada a Branislav Kontic, assessor de Palocci e chamado de “Brani” por Marcelo:

“Brani,

Por favor diga ao Chefe que do valor que meu pai se referiu, 1/3 são referentes ao apoio direto as (sic.) bases, que não passa por ele. Daí o valor 50% maior citado por meu pai.”

Gebran destaca que, em seu depoimento à Justiça, Marcelo explicou que o e-mail se refere a uma incongruência entre valores acertados por ele diretamente com Palocci e um acordo feito entre Emílio e Lula.

Em 2008, Marcelo disse que, depois de ser procurado por Palocci para financiar campanhas municipais do PT naquele ano – uma prática que não era usual por parte da empresa – ele e o ex-ministro chegaram a um entendimento de que a Odebrecht transferiria R$ 200 milhões ao PT, sendo metade para apoio a campanhas municipais de 2008 e a outra metade para a campanha presidencial de 2010.

Porém, posteriormente, Emílio Odebrecht e Lula conversaram sobre um total de pagamentos da Odebrecht no valor de R$ 300 milhões. Por isso, Marcelo disse que enviou o e-mail a Branislav para esclarecer que os demais R$ 100 milhões se referiam a valores repassados diretamente pela empresa às bases do partido.

6. E-mail de Marcelo Odebrecht à secretária de Emílio Odebrecht

Outro e-mail citado por Gebran foi enviado por Marcelo Odebrecht à secretária de seu pai, Emílio, em 30 de dezembro de 2010, às 11h04, mesma data em que Emílio diz ter tido uma reunião com Lula em Brasília. Na correspondência, Marcelo solicitou que a secretária imprimisse o documento e o entregasse ao pai.

“Imprimir e entregar para o meu pai, preferencialmente antes de ele embarcar para Brasília”, leu Gebran a partir dos autos do processo, explicando que, na viagem ao Distrito Federal, Emílio se reuniria com Lula. O relator citou uma série de “diversos assuntos elencados” na mensagem, incluindo “pontos para [Emílio] conversar com ele [Lula]”.

O relator disse que três dos pontos eram “estádio Corinthians, obras sítio e primeira palestra Angola”.

Leandro Paulsen (revisor)

RESUMO das provas e argumentos citados no voto do revisor Leandro Paulsen:

  • Interrogatório de Emyr Diniz Costa Junior, ex-engenheiro da Odebrecht e réu no processo;
  • Relatório de voos e viagens de Emílio Odebrecht;
  • Cópia da agenda de compromissos de Marcelo Odebrecht;
  • Notas fiscais emitidas pelo construtor Carlos do Prado a Fernndo Bittar, réu no processo;
  • Comprovante de estacionamento de Emyr Diniz Costa Junior.

Desembargador Paulsen vota no julgamento de Lula no caso do sítio

DETALHES das provas e argumentos citados no voto de Leandro Paulsen:

1. Interrogatório de Emyr Diniz Costa Junior, ex-engenheiro da Odebrecht e réu no processo

O depoimento de Costa Junior, que acabou absolvido no processo, foi usado por Paulsen para concluir que a Odebrecht tinha consciência da ilicitude da reforma do sítio. O engenheiro, na época, era o responsável pela obra do Aquapolo, de onde a Odebrecht diz ter desviado os recursos usados na reforma do sítio.

Segundo Costa Junior, seu superior, o diretor-superintendente Carlos Armando Guedes Paschoal, desde a primeira reunião sobre o tema já havia informado que o beneficiário da reforma era o ex-presidente Lula, que ela era “sigilosa”, e pediu que Costa Junior destacasse um engenheiro para cuidar da obra. “Ele me passou a orientação que em primeiro lugar: é claro que iria ser tratado de forma sigilosa, confidencial”, relatou ele.

De acordo com o desembargador Leandro Paulsen, o depoimento de Emyr Costa Junior “é relevante nesse caso, confirmando o depoimento prestado por Carlos Armando Paschoal, no sentido de que foi atribuída a tarefa de organizar profissionais” para garantir a execução da obra “em absoluto sigilo”.

Somados aos depoimentos do engenheiro indicado para tocar a reforma e dos demais réus no processo, além de Carlos Rodrigues do Prado, dono da construtora incumbida de executar a obra, e de outros documentos, Paulsen diz que “realmente se tratava de um favorecimento ao presidente da República”.

2. Relatório de voos de Emílio Odebrecht

Paulsen citou ainda que o e-mail de Marcelo Odebrecht à secretária de Emílio, com uma lista de “pontos de conversa” em uma reunião do pai com o então presidente Lula em Brasília, é corroborada por outra prova: um evento listado no relatório de viagens do próprio Emílio.

Segundo consta no documento, Emílio voou de Salvador a Brasília no mesmo dia 30 de dezembro de 2010, e retornou à capital baiana no mesmo dia.

3. Cópia da agenda de compromissos de Marcelo Odebrecht

Outro documento usado pelo desembargador como evidência da conversa entre Emílio e Lula foi uma anotação na agenda que Marcelo mantinha com assuntos relacionados entre ele e seu pai. Nela, ele escreveu a frase “MEET PR – 200 inclui 100. Nao 300. Ou 100 Vac”, que, segundo a denúncia, faz “referência a encontro (‘MEET’) com o Presidente da República (‘PR’), seguido das explicações sobre o montante de vantagens ilícitas disponibilizadas”.

4. Notas fiscais em nome de Fernando Bittar

Fernando Bittar é o proprietário de uma das duas partes do sítio em Atibaia, e seu nome também está nas principais notas fiscais e documentos referentes às obras de melhoria realizadas no local. Em seu depoimento à juíza Gabriela Hardt, ele afirmou que chegou a frequentar o local, mas parou de ir porque seu filho e esposa não queriam fazer a viagem até lá. Ele também disse que chegou a conversar com o ex-presidente Lula sobre vender sua parte do terreno para ele, mas disse que seu pai, Jacó Bittar, era contrário à venda.

Já especificamente sobre a nota fiscal da obra de reforma do sítio, Bittar disse que não reconhece o documento, emitido pelo construtor Carlos do Prado em seu nome. Prado diz que não chegou a conhecer Bittar, e que apenas seguiu as instruções de Rogério Aurélio, assessor de Lula, e de Emyr Costa Junior, que, por sua vez, disse ter seguido as orientações de Rodrigo Teixeira, advogado da família de Lula.

5. Comprovante de estacionamento de Emyr Diniz Costa Junior

Em seu interrogatório à Justiça Federal de primeira instância, o engenheiro da Odebrecht afirma que tem comprovantes de que esteve no escritório do advogado Rodrigo Teixeira. Trata-se de um documento de prestação de contas do motorista dele, que pagou o serviço de estacionamento na data em que Costa Junior se encontrou com Teixeira para entregar as notas da execução da reforma do sítio.

Costa Junior disse, em seu depoimento, que essas notas foram posteriormente apreendidas no apartamento de Lula em São Bernardo do Campo.

Thompson Flores (presidente da 8ª Turma do TRF-4)

RESUMO das provas e argumentos citados no voto de Thompson Flores:

  • Sociedades entre Fábio Luiz Lula da Silva, filho do ex-presidente, com os proprietários do sítio;
  • Coincidências entre as escrituras de compra do sítio;
  • Documentos apreendidos no apartamento de São Bernardo do Campo;
  • Quebra de sigilo dos e-mails de Élcio Pereira, o Maradona, empregado do sítio;
  • Dados obtidos das praças de pedágio e relatórios de diárias pagas aos seguranças de Lula;
  • Transferência de acervo do ex-presidente de Brasília ao sítio de Atibaia;
  • Interrogatórios de Alexandrino de Alencar, ex-executivo da Odebrecht e réu no processo; de Emílio Odebrecht; de Carlos Armando Guedes Paschoal; de Emyr Diniz Costa Junior e de Fernando Bittar;
  • Depoimentos de Frederico Barbosa e de Carlos Rodrigues do Prado;
  • Cópia da agenda de compromissos de Marcelo Odebrecht;
  • Relatório de voos e viagens de Emílio Odebrecht;
  • Nota fiscal emitida por Carlos do Prado em nome de Fernando Bittar;
  • Comprovante de estacionamento apresentado por Emyr Diniz Costa Junior.

Voto do desembergador Thompson Flores no julgamento de Lula

DETALHES das provas e argumentos citados no voto de Thompson Flores:

Último a votar, Thompson Flores, presidente da 8ª Turma do TRF-4, aderiu integralmente ao voto do relator Gebran Neto, e destacou um conjunto probatório que já havia sido parcialmente contemplado pelos dois desembargados de votaram antes dele.

1. Sociedade entre o filho de Lula e os proprietários do sítio

Thompson Flores citou o fato de que os dois proprietários formais do sítio serem sócios do filho do ex-presidente, Fábio Luiz Lula da Silva. Segundo o desembargador, Jonas Leite Suassuna Filho e Fábio são sócios na Sociedade Empresarial BR4, enquanto Fernando Bittar e Fábio são sócios na empresa G4 Empreendimentos.

De acordo com ele, isso indica um “intrincado relacionamento societário” entre o filho de Lula e os dois homens que, no mesmo dia, compraram as duas partes do sítio em Atibaia.

2. Coincidências entre as escrituras de compra do sítio

O desembargador enfatizou as coincidências que permeia o processo de compra das duas partes do sítio. Tanto a escritura de compra de Jonas Suassuna quanto a de Fernando Bittar foram concluídas “na mesma data, pelo mesmo escrevente, no mesmo local”.

Ele também ressaltou que Adalton Emílio Santarelli, o antigo dono de ambos os sítios, ter reconhecido a participação do advogado Rodrigo Teixeira no processo de venda do imóvel.

3. Documentos apreendidos no apartamento de São Bernardo do Campo

Além de notas fiscais de compra de objetos para o sítio, mencionadas no voto do relator, Gebran Neto, Thompson Flores também listou uma série de aquisições feita “em nome ou em favor da família”, como a aquisição de barcos, pedalinhos e outros utensílios.

4. Quebra de sigilo dos e-mails de Élcio Pereira, o Maradona, empregado do sítio

Para o desembargador, outras evidências comprobatórias ajuntadas ao processo são os e-mails trocados entre Élcio Pereira, o Maradona, e um endereço do Instituto Lula. Responsável pela manutenção do sítio, Maradona usou as mensagens para relatar “o dia a dia da manutenção do sítio”, disse Flores, incluindo detalhes sobre “animais de estimação, peixes, galinha, pavão etc.”.

5. Dados das praças de pedágio e diárias dos seguranças de Lula

Outro conjunto de provas citado pelo presidente da 8ª Turma foi um relatório com os dados obtidos a partir das praças de pedágio próximas ao local do sítio, que indicam que, entre 2011 e 2016, os veículos utilizados pela segurança pessoal do ex-presidente realizaram um total de 546 deslocamentos, o que dá uma média de um deslocamento a cada quatro dias.

Além disso, Flores lembrou ainda do relatório de diárias pagas aos seguranças de Lula entre 2012 e 2016, que indicam a quantidade de diárias pagas na ocasião de viagens até Atibaia.

6. Transferência de acervo do ex-presidente de Brasília ao sítio de Atibaia

Finalmente, a outra prova trazida no voto do último desembargador a votar no julgamento em 2ª instância foi o fato de que, quando deixou a Presidência da República, Lula fez o traslado de parte de seu acervo diretamente do Palácio do Planalto, em Brasília, para o sítio de Atibaia.

“Parte considerável dos itens pessoais do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foram transportados de Brasília para o sítio de Atibaia”, afirmou Flores, citando “documentação fornecida pela empresa de mudança Estrelas”.

Comentários no Facebook

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here