Por Gabriela Caesar e Thiago Reis, G1
O Brasil teve no ano passado 59.103 vítimas assassinadas – uma a cada 9 minutos, em média. É o que mostra um levantamento feito pelo G1 com base nos dados oficiais dos 26 estados e do Distrito Federal. O dado, inédito, contabiliza todos os homicídios dolosos, latrocínios e lesões corporais seguidas de morte, que, juntos, compõem os chamados crimes violentos letais e intencionais.
Houve um aumento de 2,7% em relação a 2016, quando foram registradas 57.549 vítimas no país. Como parte dos dados de 2017 será revisada e estados como Tocantins e Minas Gerais dizem que o balanço completo não está fechado, a tendência é que esse crescimento seja ainda maior. Além disso, em muitos estados os casos de morte em decorrência de intervenção policial não entram na conta de homicídios – ou seja, é seguro dizer que a estatística passa dos 60 mil (só no RJ, por exemplo, houve 1.124 casos do tipo no ano passado).
O levantamento faz parte do Monitor da Violência, uma parceria do G1 com o Núcleo de Estudos da Violência da USP e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Jornalistas do G1 espalhados pelo país solicitaram os dados via Lei de Acesso à Informação seguindo o padrão metodológico utilizado pelo fórum no Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado normalmente no fim do ano.
PÁGINA ESPECIAL: Mapa mostra mortes violentas no país
METODOLOGIA: Monitor da Violência
O levantamento revela que:
- O Brasil teve 59.103 pessoas assassinadas no ano passado (um aumento de 2,7% em relação ao ano anterior)
- A taxa de mortes a cada 100 mil habitantes subiu e está em 28,5
- O número de homicídios e de lesões corporais seguidas de morte cresceu, mas o de latrocínio (o roubo seguido de morte) caiu
- O Ceará é o estado que teve o maior crescimento de mortes tanto em número absoluto (1.677 mortes a mais em um ano) como percentualmente (48,5%)
- O Rio Grande do Norte é o que tem a maior taxa de mortes: 64 a cada 100 mil
Página especial
A ideia, no entanto, não foi apenas antecipar os números do ano passado, mas criar uma nova ferramenta que permita que o público acompanhe, da forma mais atualizada possível, os dados de mortes violentas no país.
Uma página especial foi desenvolvida para mostrar mês a mês os números disponíveis. O objetivo é, além de possibilitar um diagnóstico em tempo real da violência, cobrar transparência por parte dos governos.
O mapa que exibe os dados de janeiro deste ano, por exemplo, conta com as informações de 21 estados e do Distrito Federal. Outros cinco, no entanto, ainda não dispõem do número. Isso mais de um mês e meio depois. Veja a justificativa de cada um deles:
- Bahia: a secretaria diz que o setor que trabalha com o fechamento dos dados não determina um prazo para a conclusão e que, quando as informações forem liberadas, serão divulgadas
- Ceará: a secretaria diz que “os dados estão sendo consolidados e, por isso, não foram divulgados ainda”
- Minas Gerais: a secretaria diz que os dados de janeiro de 2018 serão divulgados apenas em abril. A pasta afirma que os números passam por auditagem para “total transparência e confiabilidade”
- Paraná: a secretaria diz que ainda não possui a informação. “Os dados alimentados pelas unidades policiais nos sistemas de coleta não passaram pelo crivo de qualidade para divulgação e encontram-se em processo de homologação”, diz
- Tocantins: a secretaria diz que as delegacias levam um tempo para informar os números e, por isso, o dado ainda não foi consolidado
Na página especial, é possível navegar por cada um dos estados e encontrar dois vídeos: um com uma análise de um especialista indicado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e outro com um diagnóstico de um representante do governo.
Ambos respondem a duas perguntas:
- Quem são os grupos/pessoas que mais matam no estado, por que eles matam e como isso mudou ao longo da última década?
- O que fazer para mudar esse cenário?
Não enviaram respostas às questões em vídeo Bahia, Ceará, Rio de Janeiro e São Paulo. Juntos, eles respondem por mais de 1/3 das mortes violentas no ano passado.
A Secretaria da Segurança Pública do Acre diz que tais crimes são reflexo da disputa territorial entre as organizações criminosas em todo o país, desde a execução de Jorge Rafaat, em 2016, no Paraguai.
“O Acre tem adotado medidas estratégicas de combate à criminalidade, tanto preventivas quanto operacionais. Hoje, a maior penitenciária do estado já conta com bloqueador de sinal de telefonia celular. Todas as unidades prisionais passam por reformas, os líderes das facções estão separados em celas no Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) na penitenciária de segurança máxima da capital e novas vagas para policiais Civil e Militar foram abertas em concurso público no ano passado.”
‘Astral muito baixo’
Pernambuco também apresenta uma das piores taxas de crimes violentos do país: está na 3ª posição. Em 2017, 5.427 pessoas foram vítimas de homicídio doloso, latrocínio e lesão corporal seguida de morte – número 21,2% maior que o de 2016.
A fisioterapeuta Tássia Mirella de Sena Araújo, de 28 anos, faz parte das estatísticas. Tássia foi morta em abril dentro de casa, vítima de violência sexual e tortura. O suspeito era vizinho da fisioterapeuta e foi denunciado pelo Ministério Público. O caso ainda não foi a julgamento.
“Já vai fazer um ano que [o crime] aconteceu. Nós estamos há 11 meses… E até hoje, todos os dias a gente lembra, todos os dias a gente chora. E quando passa uma data como essa agora que passou, 8 de março, Dia Internacional da Mulher, a gente fica com o astral muito baixo”, afirma o pai da vítima, Wilson Araújo.
A Secretaria de Defesa Social diz que “trabalha intensamente para quebrar a espinha dorsal dos homicídios”. “Entretanto, é preciso entender que a questão da segurança pública passa pelo cenário brasileiro, que demonstrou aumento de homicídios em todo o território nacional, sobretudo no Nordeste. Pernambuco não está imune a essa questão, sofrendo as consequências da falta de fiscalização nas fronteiras (a fim de evitar a entrada de drogas e armas), da ausência de vagas em presídios federais e de uma política nacional de segurança, assim como da insuficiência de recursos da União para apoiar os estados. O crime organizado está em todo o território nacional, agindo de forma articulada, e os estados não podem seguir isolados e sobrecarregados nesse embate”, afirma, em nota.
Participaram desta etapa do projeto:
Coordenação: Athos Sampaio e Thiago Reis
Edição (conteúdo): Clara Velasco, Gabriela Caesar e Thiago Reis
Pré-produção: Ricardo Gallo
Produção:
Geisy Negreiros e Iryá Rodrigues (G1 AC)
Derek Gustavo, Cau Rodrigues e Jacinto Branco (G1 AL)
John Pacheco, Lorena Kubota e Fabiana Figueiredo (G1 AP)
Ariane Alcântara, Andrezza Lifsitch, Leandro Tapajós, Patrick Marques e Paulo Dutra (G1 AM)
Egi Santana e Henrique Mendes (G1 BA)
Marília Cordeiro, Mateus Bandeira e Valdir Almeida (G1 CE)
Marília Marques, Maria Helena Martinho e Carlos Átila (G1 DF)
Manoela Albuquerque e Rodrigo Rezende (G1 ES)
Paula Resende, Murilo Velasco, Sílvio Túlio e Vitor Santana (G1 GO)
Dino Alves, Francisco Batalha, Evandro Azevedo, João Batista Carvalho, João César, José Chagas, Miguel Chaves, Rafaelle Fróes, Osvaldo Leite e Zeca Soares (G1 MA)
Lislaine dos Anjos, Pollyana Araújo e Wagner Silva (G1 MT)
Anderson Viegas, Juliene Katayama e Nadyenka Castro (G1 MS)
Cíntia Paes, Humberto Trajano, Raquel Freitas e Thais Pimentel (G1 MG)
Taymã Carneiro, Jorge Sauma e Moisés Nascimento (G1 PA)
Anderson Silva, André Resende, Clara Rezende e Gabriela Muniz (G1 PB)
Adriana Justi e Erick Gimenes (G1 PR)
Bruno Marinho, Luiza Mendonça, Marina Meireles e Pedro Alves (G1 PE)
Carlos Rocha e José Marcelo (G1 PI)
Affonso Andrade, Felipe Grandin e Susan Vidinhas (G1 Rio)
Anderson Barbosa, Rafael Barbosa e Juliana Silva (G1 RN)
Daniel Fávero, Otávio Daros e Gabriela Haas (G1 RS)
Andriele Padilha, Jeferson Carlos e Jonatas Boni (G1 RO)
Alan Chaves, Emily Costa, Marquelo Marques e Valéria Oliveira (G1 RR)
Mariana de Ávila e Allan Postal (G1 SC)
Paulo Toledo Piza (G1 SP)
Anderson Barbosa, Joelma Gonçalves e Osmar Rios (G1 SE)
Jesana de Jesus, João Guilherme Lobasz e Vilma Nascimento (G1 TO)
Roteiro (vídeos): Beatriz Souza
Edição (vídeos): Eduardo Palácio
Edição (infografia): Rodrigo Cunha
Design: Alexandre Mauro, Roberta Jaworski e Igor Estrella
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